Contrastes em terras amazônicas: COP30 em Belém
A Amazônia se transformou em vitrine. E Belém, num camarim apressado. A cidade onde parte considerável da população ainda lida com a falta de saneamento, vive em palafitas e enfrenta alagações, foi a escolhida para receber a COP30, o principal evento climático global.
A justificativa oficial? A beleza exuberante da floresta, os manguezais ricos, os rios serpenteantes. A dura realidade? Um cenário construído às pressas, com ornamentos artificiais e diárias com preços exorbitantes.
Quão simbólico: enquanto o mundo discute o aquecimento do planeta, Belém superaquece nos preços. Diárias que antes custavam cerca de R$ 300 agora alcançam R$ 9 mil. Nem mesmo nos tempos áureos da borracha se testemunhou algo parecido. A nova fronteira da sustentabilidade parece ser o lucro, desde que bem servido e divulgado em discursos ecológicos.
O paradoxo salta aos olhos. A COP30 almeja debater justiça climática numa cidade marcada pela desigualdade social. As obras permanecem inacabadas. O número exato de participantes ainda é uma incógnita. A capacidade hoteleira, por sua vez, é claramente insuficiente.
E a solução do governo brasileiro? Em puro estilo Macunaíma: improvisa-se com navios de cruzeiro. Mas não se trata de qualquer embarcação, resorts flutuantes, como o MSC Seaview e o Costa Diadema, equipados com luxo e mordomias.
Se faltam acomodações em terra, que se hospedem no rio. A COP30 promete ser a conferência climática mais cômoda de todos os tempos. A diplomacia brasileira agora singra em cabines luxuosas, com vista privilegiada para o Rio Amazonas e champanhe à mão.
Belém, desse modo, se desfaz da sua identidade e se torna um mero cenário. A floresta, um pano de fundo. A pobreza, algo a ser escondido. O que deveria ser uma transição ecológica se transforma num espetáculo onde a artificialidade se sobressai à natureza.
Os velhos mitos resistem. A floresta ainda é chamada de “pulmão do mundo”, apesar de a ciência já ter refutado essa imagem. Mas os dados parecem importar menos do que os slogans, repetidos em Paris entre um brinde e outro.
Enquanto isso, um executivo do Vale do Silício talvez ainda confunda a Amazônia com a Amazon. E Belém? Para muitos estrangeiros, continua sendo um ponto indefinido entre o Caribe e a fantasia.
A COP30 revela, assim, mais do que uma crise ambiental: expõe uma crise de credibilidade. Como pode um país que sequer consegue organizar a sua própria rede hoteleira liderar a pauta da sustentabilidade em nível global?
Sustentabilidade requer planejamento, estrutura e responsabilidade. Não se improvisa um planeta. Nem se disfarça a miséria com enfeites. A floresta precisa ser levada a sério. E Belém, também.
*Ycarim Melgaço é professor e escritor. Autor do livro: História das Viagens e do Turismo. Ed. Aleph. SP. Instagram: @ycarim
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